Voltar a casa
Quando meteu a chave à porta, a casa parecia-lhe deserta.
Já há quase um mês que ela decidira que tinha chegado a altura de pôr um fim a esta relação. Desde esse dia que não entrava naquele hall...
Finalmente, tinha decidido ir buscar os caixotes que amparavam quinze anos de vida.
Ela ligara-lhe há um par de dias a pedir para vir “tirar esta porcaria daqui, que estou farta de tropeçar nestes caixotes. Se poderes vem durante o dia para não ter que te ver! Está tudo encostado na parede da sala.”
Aquelas palavras ecoavam vezes sem conta na sua cabeça e agora que estava novamente ali gritavam-lhe dentro dos ouvidos.
Arranjou coragem e foi caminhando, olhando em redor como se estivesse a assistir a um filme onde já nem se lembrava de ter sido protagonista.
Surpreendentemente, apesar do deserto em que se encontrava a casa, estava tudo na mesma. Fotos a dois, prendas trocadas, móveis, cortinados, tudo tal e qual como haviam um dia projectado.
Seguiu para a sala à procura da tal porcaria de que ela falara, mas nada... Nem caixotes, nem caixinhas.
Em vez disso uma mesa posta, como noutros tempos, pratos, copos e talheres para dois.
E um bilhete: “Se estiveres aqui, espera por mim!!!” Só então percebeu...
Ela queria conversar!!! Algo a que sempre se tinha recusado. Nunca lhe explicara o porquê da decisão de se separarem. Apenas falava em cansaço e mais cansaço. “Mas cansaço de quê?” Tantas vezes se interrogou ele.
Mas agora isso já não tinha a menor importância! Sentou-se no degrau da porta.
Ia esperar, claro que ia esperar! Com uma voz suave a entoar na sua cabeça.
Iria existir uma segunda vez…?